Entrevista: Julia Drummond

julho 09, 2020


Para quem o Direito de Família foi pensado? E quais tem sido as consequências da sua aplicação? Pensando nisso, Julia dos Santos Drummond escreveu Casamento e mulheres negras, fruto de sua dissertação de mestrado, para você, estudante negra (o) de direito ou não.


Com uma escrita forte e sincera, Julia rompe as barreiras do que conhecemos como saber acadêmico através de um criterioso e sensível estudo. É pioneira ao investigar de que maneira as mulheres negras são protegidas, ou não, pelo Direito de Família brasileiro e suas expectativas familiares. 


Julia Drummond nasceu na cidade do Rio de Janeiro e concluiu o curso de direito na Universidade de São Paulo. Ela  ajudou a fundar o coletivo antirracista Quilombo Oxê. Hoje, com 27 anos, é advogada, pesquisadora e mestra em Direitos Humanos pela USP. Inspirou-se na luta antirracista e feminista para escrever a dissertação de mestrado,  que deu origem a o seu primeiro livro.

 

Convidamos a autora do livro para uma pequena entrevista. Ela nos conta um pouco sobre a temática de seu livro e o processo de construção da obra. Confira:


1) De onde surgiu a ideia e a iniciativa de escrever Casamento e Mulheres Negras?


Eu sempre gostei de Direito de Família. No final da graduação, comecei a participar de coletivos feministas e antirracistas e passei a me interessar pelo tema da solidão da mulher negra. Ao começar a estudar mais o assunto, percebi que poderia fazer uma ponte entre o direito e a prática das mulheres negras dentro desse tema.

2) O que os leitores podem esperar do livro?

Os leitores podem esperar uma aproximação do direito menos ortodoxa e mais inovadora, pois tentei ao máximo sair da chave estritamente doutrinária, mas sem perder o rigor acadêmico. O livro deve abrir portas para o direito antidiscriminatório àquelas pessoas que ainda não tiveram contato com o ramo e, àquelas que já estudam o assunto, espera-se um novo olhar sobre o Direito de Família.



O livro está disponível no site da Editora Letramento.


3)  A sua obra traz um debate sobre para quem o direito familiar foi pensado, permeando por assuntos que envolvem desigualdade social, racismo e solidão afetiva da mulher negra. Foi difícil romper as barreiras do que conhecemos como saber acadêmico para tratar de um assunto, muitas vezes, ignorado?

Olha, pra falar a verdade, o debate racial já é bastante consolidado em algumas universidades mundo afora. É dizer, temos vasta bibliografia estrangeira e obras riquíssimas no Brasil, porém constantemente ignoradas. Eu entendo que a minha orientadora foi fundamental para o rompimento das barreiras epistemológicas, pois ela não somente reúne uma produção preciosa sobre as questões raciais no Brasil como me deu liberdade para pensar por mim mesma e explorar o Direito fora das caixinhas da faculdade. 

4) Você realizou um extenso levantamento bibliográfico e fez uma pesquisa qualitativa para perguntar às mulheres negras como constituem suas relações afetivas. Como funcionou está pesquisa? Como entrevistou essas mulheres?

Eu fiz uma pesquisa empírica baseada no método bola de neve, ou seja: você começa perguntando para pessoas próximas e pede para que elas compartilhem com aquelas que se encaixam no perfil da pesquisa. Utilizei formulário do Google e divulguei nas minhas redes sociais. Organizei as perguntas em seções sobre família e acesso à justiça e depois juntei tudo e fiz análise de conteúdo, classificando as respostas em categorias. 


5) Defina Casamento e Mulheres Negras em uma palavra.

Inovadora.

6) Para aqueles que desejam se aprofundar mais no assunto, que livros recomenda?

Virou regra?, de Claudete Alves; Mulher Negra: Afetividade e Solidão, de Ana Cláudia Lemos Pacheco; A invenção do ser negro, de Gislene Aparecida dos Santos; Manual de Direito das Famílias, de Maria Berenice Dias; Racismo e sexismo na cultura brasileira, de Lélia Gonzales; Pensamento Feminista Negro, de Patricia Hill Collins; Living to love, de Bell Hooks.

7) Conte-nos um pouco da sua trajetória profissional. Quem é Julia Drummond? Quando ela começou a também ser escritora?

Bom, eu sou advogada formada pela USP e atualmente mestre também pela mesma instituição. Sou carioca, morei em Natal/RN por 6 anos e moro em São Paulo há quase 9 anos agora. Virei escritora quando decidi fazer pós-graduação, mas antes já gostava de dar pitaco nas redes sociais e acabei me aventurando no Medium, só que lá eu gosto de escrever resenhas de séries. Participo de grupos como a Rede Feminista de Juristas e já integrei coletivos universitários. Estou nessa eterna busca por mudanças e sempre repensando o meu papel na luta por direitos, sem a pretensão de ser heroína, como já nos ensina Angela Davis, mas sim buscando entender formas de atuar no meu campo de estudos. E amo gatos haha.

8) Por fim, quais os projetos que você têm para o futuro? Existe alguma outra publicação dentro dos seus planos?

Estou participando do processo seletivo para o doutorado em direitos humanos na USP e tenho a intenção de publicar todos os artigos que escrevi no mestrado, se as revistas aceitarem. Penso que todas as produções que eu puder publicizar, seja por artigos, seja por livros, eu vou divulgar, porque o conhecimento existe para ser compartilhado. Quem sabe a Letramento aceita a minha futura tese de doutorado também? haha

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