Pelo cu: políticas anais
junho 28, 2019
O cu é o grande lugar da injúria, do insulto, como vemos em muitas expressões cotidianas. A penetração anal como sujeito passivo está no centro do discurso social como o horrível, o mau, o pior. Mas na atualidade existem culturas que se reapropriaram deste lugar abjeto e souberam convertê-lo em um lugar produtivo e positivo.
Neste livro, os autores fazem um estudo amplo e ameno, recorrendo ao redor do cu e do sexo anal, passando por sua história, valores de como o ânus organiza os gêneros e as sexualidades e de como esttá atravessado por critérios de raça, classe e poder. Desde a complexa sexualidade anal na Grécia Antiga até a crise da Aids, passando pelas prisões, o Bareback, Freud, as lésbicas butch, os sodomitas, o técnico de futebol Luís Aragonés, o fist-fucking ou os ursos, este livro traça a genealogia de um dos espaços menos explorados pela teoria, mmas o mais transitado pela prática: o espaço anal.
Texto da quarta capa do livro.
Em 2015, fui contactado por Rafael Leopoldo a propósito de um poema de Allen Ginsberg que eu havia traduzido: “Esfíncter”. O tradutor de Pelo cu, queria utilizá-lo na epígrafe, já que os autores Javier Sáez e Sejo Carrascosa o haviam citado, usando uma tradução ao espanhol. Começamos então uma conversa sobre o tema e ele, sabendo de meus trabalhos editoriais, acabou por me contratar como o revisor da tradução.
Inicialmente achei o título extremamente provocativo e, confesso, essa foi uma das coisas que mais me atraíram no projeto. Mas minha surpresa aumentou ainda mais à medida em que fui conhecendo o texto, que considero ao mesmo tempo esclarecedor, propositivo, traz importantes análises dos contextos em que estamos vivendo e reorganiza diversos dos processos sociais que entraram para as urgências da vida contemporânea.
Após enumerar diversas injúrias em diversos idiomas sobre a questão anal, os autores fazem, primeiro, um estudo do que é o “ser macho”. São diversos os casos em que acabamos por ouvir alguma escusa para que amplie o tabu do ânus. Afinal, nas sociedades ocidentais, todos os seres humanos são penetráveis, com exceção do homem hetero. O homem é o impenetrável.
Mas esta conclusão, que trata de uma questão aparente não fala a respeito de TODOS os homens. Toda interdição é, por princípio, um objeto a ser subvertido. É comum homens hetero pedirem para serem penetrados por suas mulheres, assim como há imensas multidões de homens que frequentam ambientes em que possam ser penetrados em segredo.
Dessas primeiras interpretações da masculinidade é que surge uma teoria da passividade como fonte de prazer. “Não, o sexo não se reprime ou ao menos não de maneira uniforme”, dizem os autores. Essas incoerências que existem ao redor do cu é que formam o grande corpus deste ensaio, assim como uma análise das diversas subversões dos dispositivos heterocentrados. Para lidar com esses sistemas de tabus e hipocrisias, é que os autores aconselham logo de início: “abra o seu cu e abrirá sua mente”.
Ao longo das páginas desta obra, encontramos diversos temas que fazem parte do universo queer. Algumas desconhecidas da grande maioria. O livro segue as trilhas deixadas por teóricas/os tão importantes como Judith Butler e Paul B. Preciado, sempre colocando em questão alguns aspectos chave.
O time envolvido neste trabalho é extremamente interessante. Javier Saez, que é sociólogo e tradutor, autor de um ensaio de nome “Teoria queer e psicanálise” e tradutor de Monique Wittig, Judith Habelstam, dentre muitos outros. Sejo Carroscosa, que se diz um “alérgico” ao mundo acadêmico, foi ativista em diversos grupos de caráter antiautoritário e de liberação sexual. Rafael Leopoldo, o tradutor, por fim, é um filósofo belorizontino, com diversos artigos publicados e uma carreira de professor que tem se solidificado nos últimos anos.
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