Sobre as aventuras e aprendizados de ser uma estrangeira… na China!
maio 13, 2019
Em um
mês completam 3 anos que deixei a China, país que me acolheu durante 5 anos da
minha vida. E me transformou. Transformou minha forma de ver o outro e a mim
mesma. Mudou a minha visão – até então tão limitada – de mundo.
Assim como Alice que caiu na toca do coelho e
se deparou com um mundo completamente novo, cheio de criaturas fantásticas e
precisou estar aberta ao desconhecido, eu também tive a impressão de estar
entrando em um universo paralelo quando cheguei nesse país tão imenso e
paradoxal.
Mas ao invés de objetos e animais falantes, figuras surreais e psicodélicas,
encontrei pessoas de olhos puxados, falando e escrevendo um idioma que
mais se aproxima de pinturas rupestres do que de nosso alfabeto; contrastes de
arquitetura imponente e milenar com prédios modernos; cultura peculiar; uma
sociedade de filhos únicos; um governo que, apesar de ser
responsável por grande parte da população mundial, ainda
assim consegue controlar com destreza cada passo de seus cidadãos; e
um modo de encarar a vida bem diferente do que eu conhecia até
então.
Já era de se esperar que o choque seria imenso! Como Alice, ou o
coelho que sai da cartola do mágico ou mesmo
uma criança recém-nascida, senti aquela sensação de
surpresa, fragilidade e insegurança. Apesar de assustador, simultaneamente,
minha curiosidade e empolgação em desvendar os mistérios desse meu
novo mundo tomaram proporções gigantescas. O meu olhar se igualou ao
deles. Ver o mundo como se fosse a primeira vez e conseguir lembrar
disso é realmente interessante.
Quando crianças, nossos sentidos são mas aguçados, pois experimentamos tudo
pela primeira vez. Crescemos e nos acostumamos com o que já conhecemos. Um céu
azul e limpo já não nos causa impacto (a não ser que você viva em um país onde
os níveis de poluição são altíssimos ou onde o inverno dure quatro meses).
Estamos ocupados e o tempo voa. Por isso acabamos esquecendo a
deliciosa sensação de experimentar algo pela primeira vez. É uma
sensação realmente transformadora.
Não apenas
pela oportunidade de ver paisagens e ouvir novas canções que elevam a
alma, cruzar o caminho de pessoas interessantes, culturas intrigantes,
experimentar novos sabores, cheiros, expandir os sentidos e a
percepção, enfim, mas principalmente porque quando alguém se propõe
a entrar na toca do coelho, fica frente a frente também com seus maiores
medos, limitações e desafios. Assim, aprende-se mais sobre si
mesmo e, consequentemente, sobre o outro.
Nos despimos de pré-conceitos, nos rebaixamos a posição de aprendiz, sem
necessariamente nos sentirmos rebaixados, perdemos a petulância, descemos
do pedestal e aprendemos a nos adaptar às mais
variadas condições. Basicamente voltamos a ser crianças. Reaprendemos
a ver o mundo com um olhar menos cruel. Perdemos a vergonha ou o medo de
interagir com o outro. Não nos preocupamos se estamos
parecendo ridículos ou não. Muitas vezes precisamos reaprender a
falar, ler, escrever, entender, se fazer ser entendido e, principalmente,
ouvimos mais do que falamos. Observamos mais do que julgamos.
E
diante das inúmeras dificuldades e desafios que enfrentei durante esses 5 anos
em que conheci a minha versão mais vulnerável, em que me vi analfabeta e
dependente de tudo e de todos, esta foi, sem dúvidas, a maior lição que a China
me ensinou. Olhar o outro com mais empatia. Abraçar a diversidade (mesmo quando
ela parece ser tão igual). Estar aberta pra aprender sem julgamentos e não ter
medo de se expor. Por essas e outras, eu saí da China, mas a China nunca vai
sair de mim.
Se
quiser saber um pouco mais sobre esse país tão misterioso, embarque com a Jade,
protagonista do meu romance de estreia “Que o Oriente me oriente” em uma viagem
de trem que cruza a China continental até a chegada ao Tibete.
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